terça-feira, setembro 14, 2004

(História) Um Homem Rico - I

Lembro-me muitas vezes do nosso sítio...

...pequenino, humilde e muito acolhedor. Na sala tem sofás pequenos e macios onde os nossos corpos repousam e se entrelaçam... os nossos pés vagueiam pelos tecidos e o ar fresco da casa arrepia nossos corpos... mantemo-nos sempre juntinhos.

A mesa de jantar é redonda (pequena) e tem por cima aqueles candeeiros que se ajustam (descem e sobem) e que também não são nada bonitos... mas aquele é castiço... porque é nosso. Temos uma televisão mono pequena e uma aparelhagem ao lado (também é pequena).

O nosso quarto tem uma cama baixa e muito larga e imensos pufs e almofadas pelo chão. Normalmente usamos todo o quarto quando nos amamos... tem prateleiras baixas cheias de livros que devoramos nos intervalos de fazer amor. Não tem luz no tecto, mas antes 3 pontos de luz indirecta.

Por vezes a luz do dia entra por pequenas frinchas pintando o quarto de um azul, laranja e cinzento, fresco e convidativo ao ronronar. Também temos um edredon de penas, muito leve, caído no chão e que usamos para aquecer momentaneamente os nossos corpos quando arrefecem. Não mostramos nunca o nosso quarto a ninguém. É apenas nosso.

A casa de banho é pequena, e por isso normalmente quando lavas os dentes estou sentado na sanita a admirar-te... ali não fazemos amor com os pés no chão... as paredes estão próximas e tanto o lavatório como a banheira ajudam a certos equilíbrios...

Temos um espelho muito pequeno à frente do lavatório... vemos apenas a nossa cara. Tenho dificuldade em fazer lá a barba. O reposteiro que separa a banheira do resto já caiu várias vezes fruto das nossas loucuras e desta vez mandamos aparafusar o dito na parede... os azulejos ficaram esbutenados e por isso estás sempre a dizer para colocarmos umas chicletes naquelas ranhuras horríveis.

A cozinha tem um pequeno fogão eléctrico (daqueles que estão separados de tudo) e alguns armários de madeira (penso que são de contraplacado)... a pintura já não ajuda, mas juro que um dia os vou pintar da tua côr favorita. Para já não há dinheiro.

Temos outro quarto, um +1. Não tem luz directa e por isso usamo-lo para os nossos materiais de pintura. Nem tu nem eu pintamos bem, mas fazemos muitas asneiras com as tintas... já simulei que a minha tela eras tu... ficaste com um ar de arco-iris.

Também temos uma varanda pequenina com vista para as traseiras... vemos as hortas de alguns vizinhos... por incrível que pareça não temos aí prédios à nossa frente e por isso às vezes juntamo-nos lá para sonhar com o dia em que iremos fazer férias fora de casa.

Também sonhamos muitas vezes em um dia trocar de casa, mas por agora acho que nos sentimos bem nesta.

O nosso carro fica ao relento, mas a rua é sossegada e por isso não nos falta lugar. De manhã, enquanto acabas de te arranjar eu vou descendo para empurrar o carro de modo a que pegue... talvez no próximo mês possamos colocar-lhe uma bateria nova.

Lembras-te quando fomos para a porta do casino ver todas aquelas pessoas bonitas e bem vestidas entrar? Acho que não devem ter uma casita como a nossa, mas tenho dúvidas se será tão acolhedora...

A camisa que me ponteaste ficou muito bem e já a posso levar outra vez para o trabalho. É bom sair às 17h porque ficamos com muito tempo para nós...

Hoje à noite vamos cozinhar os dois... fui ao Continente e comprei uma garrafita de vinho... vamos comemorar o facto de nos amarmos.

Sei que o fogão não ajuda, mas podiamos tentar fazer uma tarte de maçã e, por ser dia especial, uma sopa fresquinha.

Hoje à noite vou-te fazer uma promessa: vou tentar trabalhar um pouco menos para ter tempo de te fazer ainda mais feliz.

No Natal espero conseguir oferecer-te um perfume. Sei que não necessitas, mas gostava que te sentisses uma Princesa quando saírmos novamente para ver o mar com as roupas novas que compramos no Continente.

Antes de nos irmos deitar vamos encher a banheira e deliciarmo-nos com um banho relaxante... como o espaço é tão pequeno, hoje prometo que te deixo ficar com as pernas por cima. Se um dia conseguirmos, vamos comprar uns sais de banho para fazer muita espuma.

Amanhã de manhã não me apetece ir trabalhar... gostava muito de ficar agarradinho a ti a manhã toda, não vá a vida um dia pregar-me uma partida e levar-te para longe de mim. Amanhã não vou mesmo trabalhar...

Vou aproveitar mais uma vez o facto de estarmos juntos e não adiar este matar de saudades. Sabes, não quero mesmo que a vida te leve... esta casa é bonita contigo, mas deixa de fazer sentido sem ti... é como as minhas camisas e todas as coisas usadas que tenho: são bonitas porque estão ponteadas e arranjadas por ti.

Porque se assim não fosse, sentia-me um pobre.

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