quinta-feira, agosto 16, 2007

(Dissertação) Vidas Diferentes

Gostava de começar por tipificar a vida em apenas dois tipos abrangentes. Todos nós temos vidas diferentes, mas, na sua essência, prefiro pensar, para o tema que vamos abordar, que existem apenas dois tipos de vida: uma mais cinzenta, previsível e cansativa pelo seu vazio, e outra, bem mais colorida, cheia de acontecimentos e de desafios que aumentam o nosso conhecimento. Chamemos-lhes a Previsível e a Repleta.

Desde os primeiros anos de vida que o dia-a-dia de uma criança é feito de descobertas e experiências novas. E estas sensações prolongam-se normalmente até à idade da adolescência.

Após a adolescência, altura em que é mais previsível uma vida repleta de emoções, alguns adultos tendem a diminuir a sua capacidade criativa à medida que envelhecem, concentrando os seus esforços apenas na sua actividade profissional e ocupando o resto do tempo numa permanência muitas vezes quase que obrigatória junto da família (o que é diferente de dizer em família).

Transformaram as suas vidas em algo de mais rotineiro, mais certo, mais rectilíneo, mais expectável e por isso mesmo, menos oscilante. Encaixaram-se na tipificação Previsível.

Quanto a mim, muitos foram sendo aniquilados pelo medo do “novo”, porque o “novo” pode colocar em causa tudo o que está dado como certo e adquirido até ao momento. Esqueceram-se que viver por viver nem sempre é viver.

Do “outro lado” da vida, existem adultos que preenchem a sua vida com diversas actividades para além da actividade profissional e da vida familiar. Estão na tipificação Repleta.

Dedicam-se muitas vezes à cultura (pintura, escrita, leitura, música), aos desportos (ténis, futebol, natação), às viagens e aos trabalhos manuais (jardinagem, olearia, bricolage), entre outras actividades possíveis, enfrentando muitas vezes grandes desafios de pesquisa para ultrapassar dificuldades, à medida que o seu conhecimento aumenta.

São por vezes pessoas auto-didactas, que aprendem por si e para si, para seu único prazer. E, nessa busca incessante de auto-conhecimento, estabelecem métodos, objectivos, caminhos e fórmulas alternativas para superar os desafios.

Tornam-se normalmente, pessoas extrovertidas e optimistas, com uma grande dose de auto-confiança e um carisma distinto. São pessoas com vidas preenchidas, plenas.

Temos então os Previsíveis, os que se acomodam à vida que têm, sem sequer perceberem que o comodismo também é uma espécie de sinónimo de desistência.

Quem se acomoda desiste muitas vezes de viver. Passam a estar apenas vivos, o que não significa exactamente viver.

Quantas pessoas não se acomodam a ideias feitas e a chavões para justificarem perante eles próprios a sua desistência de algo?

Porque para muitos é sempre mais fácil desistir do que ter de lutar por algo, ainda para mais quando o resultado de uma luta e de um enorme esforço, pode ser exactamente igual ao da desistência – a perda.

Quem pretende garantir já hoje que algo possa resultar no futuro, não percebeu ainda a essência de viver: o Aqui e Agora.

É imprescindível perceber a impossibilidade de garantir um futuro sem actuar no Aqui e Agora, pela simples razão de que o futuro não pode ser nunca garantido – mas ele pode ser trabalhado a todo o momento, no Aqui e Agora – e isso dá trabalho, muito trabalho, não oferecendo garantias para além da consciência de se estar a tentar.

É também essencial encarar o “novo” como um desafio e não como uma ameaça a um aparente bem-estar. O homem pode ser considerado maduro quando reconhece que é o único responsável pelo que lhe acontece. E o que lhe acontece deveria estar sempre relacionado de alguma forma com o “novo”.

Os homens Previsíveis tendem a justificar o fracasso com factores externos, com coisas que não podem controlar. Mas, na maioria dos casos, os insucessos são fruto das suas próprias desistências.

Alguém se revê nas frases “deixei de acreditar que esta relação possa dar certo”, “deixei de acreditar que este emprego me dê futuro” ou “deixei de acreditar na vida que levo”?

Na grande maioria dos casos, o fracasso acontece porque focamos as nossas expectativas apenas no que a outra parte pode fazer, esquecendo-nos da contribuição que nós próprios poderíamos e deveríamos ter dado.

É uma postura egoísta, que conduz invariavelmente ao fracasso mas que, curiosamente, não costuma causar grandes danos em quem perde. E porquê?

Porque se arranjam as defesas necessárias para culpar factores externos, como os outros, as circunstâncias ou a falta de meios.

Em contrapartida, são pessoas Repletas, com uma vida mais colorida e mais cheia de acontecimentos, as que atingem o sucesso.

E a grande diferença normalmente reside em dois factores: na atitude e na capacidade de perceber que somos nós próprios os únicos responsáveis pelo que nos acontece, a que chamo maturidade.

A atitude certa leva-nos sempre a ser mais persistentes e mais perseverantes, leva-nos a acreditar mais e a não desistir enquanto sentirmos que algo ainda depende de nós.

A maturidade dá-nos a capacidade de perceber que somos nós próprios os únicos responsáveis pelo que nos acontece.

Sem desculpas externas às quais recorrer, sem desculpas que nos possam iludir sobre a responsabilidade do fracasso, a nossa forma de agir fica mais orientada para o sucesso, muitas vezes porque é apenas o único caminho que nos resta.

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